Quem leva sonhos a sério? Comum o
comentário: “Coisa maluca, nem me lembro direito”. Que sua linguagem simbólica
desconcerta, desconcerta. E a loucura amedronta. Necessário entender? Há quem
não aceita, vendo sonhos como o lixo que a vida circunstancial faz transbordar
sem sentido. Para o sociólogo Roger Bastide (1898-1974) sonho, transe e loucura
podem ser explicados pela história do indivíduo. Daí o interesse da psicanálise
e da psicologia analítica de Jung. A interpretação de Bastide rompe com as
correntes científicas formulando uma instigante compreensão sociológica desses
processos. São canais de comunicação entre o mundo da chamada realidade e o
sobrenatural. A mitologia e o atemporal entram aqui. A história e o cotidiano
do indivíduo não bastam. O sonho chega a ter função reveladora, como mensagem,
orientação oracular para o dia a dia das pessoas. Roger Bastide argumenta que a
loucura sobrevém quando as pontes entre o mundo da realidade e o sobrenatural
sofrem algum tipo de bloqueio. É como se o humano fosse separado de suas
origens ancestrais. Estamos sujeitos a pactos religiosos que não devem ser negligenciados.
Em nossa sociedade a própria visão de mundo sofre pressões de uma cultura que
enfraquece nosso interesse pela vida coletiva, pela família. A pessoa reduzida
a um estado utilitário, consumista, sob a égide do mercado. A vida cotidiana
sob “n” induções supérfluas condicionadas pela aspiração de melhor status. Ver
para crer, só acreditar no que se ouve, toca, e percebe com os sentidos
materiais. As pessoas submetidas à condição de puro indivíduo, ensimesmado,
sozinho, sem poder se apoiar numa gramática social que lhe permita a
compreensão do próprio lugar na comunidade. A vida perde o sentido. Nem é
preciso dar a certa maneira de pensar o epíteto de religião, seja candomblé ou
espiritismo. Com a palavra Jung: “(Os sonhos) não iludem, não mentem, não
deformam, não encobrem, mas comunicam ingenuamente o que são e o que pensam”.
Ele continua: “Só são irritantes e enganadores se não os compreendermos”. Na
sua linguagem simbólica “quer sejam originais ou difíceis, a experiência demonstra
que sempre se esforçam por exprimir algo que o eu não sabe e não compreende”.
Não tendo a pretensão de decifrar o que nos parece complexo e caótico, ao
registrar o conteúdo onírico, datando-o, depois se pode compará-lo com os fatos
ocorridos. O sonhador pode se ver em cada peça do sonho. Sonhos noturnos ainda
podem nos alertar sobre o dia que vai começar, recomendando atitudes e comportamentos.
Sob o aspecto premonitório chegam a contribuir para aclarar a consciência.
Nesta madrugada sonhei. As melhores potencialidades despertas, atuava de forma
solta, raro contentamento. Colagem de cenas e situações enunciadas ou já
vividas. Roteiro estupefaciente em que o correto e o incorreto surgiam de forma
rápida para orientar o grupo que me assistia. Pedagogia de fortes contrastes, o
que denuncia e o que aprova, com vistas ao fortalecimento do “eu profundo” como
se o autor estivesse no Todo e o Todo nele.
Parecia que não se chegaria a um final, quando acordei.
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