A
IDADE DE OURO
Euclides Sandoval
Nunca
ver o tempo como terminal. Faz parte dele nos desafiar. Não incorporá-lo à
nossa própria finitude. Valorizar o presente mais do que o passado e o futuro.
O aqui e o agora, o “como” as coisas acontecem, importam mais do que os
“porquês”. A responsabilidade é de quem navega em águas mansas ou turbulentas.
Acreditar na possibilidade de contornar o cabo das tormentas, saindo vivo. Depois
da morte o tempo é mais do que um consolo. Continua a aprendizagem evolutiva. É
o viver como eterno. A luta pela
continuidade da existência é o bem maior. Nem tudo está impregnado pelo desastre
e pela tragédia, desde que não sejamos os autores de males que nos atingem e a
quem amamos. Mesmo nos desconcertos, o tempo oferece novas oportunidades fora
das dores e dos sofrimentos conhecidos. O pior é se debater contra o mundo chegando a
tristes desfechos. Entregar-se à loucura da autodestruição, ou dos sentimentos
tormentosos, pode não nos dar tempo para afirmar um ego otimista. Temos o
direito à preguiça e o imenso prazer de esquecer. Paciência e abertura para
intuições, ainda que possam gerar confusões numa época em que a tônica é a
racionalidade. Triste a existência em permanente temor, sob a angústia
cotidiana, a renúncia do gozo. Não aquecer a extrema solidão de uma pessoa
separada das outras. Ao se sentir desamparado, isso pode ser atribuído a um superego
que cresce e incha na proporção exata do desamparo. Não internalizar,
fortalecendo o sentimento de culpa como resultado de ascético isolamento.
Desgosto da vida, a negação do prazer, o bloqueio do inesperado e do
surpreendente, a necessidade de controle absoluto sobre a felicidade alheia são
antifaces tirânicas. A idade de ouro é o tempo que nos foi dado viver.
(Reescrito para o Jornal Livre/maio-2015)
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LIBERDADE PARA ESCOLHER
A.
Costamares
Comum ouvir pessoas ressaltarem o fator “limite”.
Algo muito presente em “educadores” pouco interessados na autonomia dos
indivíduos e na interação social. A fim
de repreender a libertinagem, com o devido esclarecimento sobre razões, já é
outra coisa. O adequado é compreender quando o abuso de poder não é nada
democrático. Lembro a expressão: “a liberdade de um termina onde começa a liberdade
do outro”. Há um componente aí, a ferir as leis humanas, se imaginamos clima de
reciprocidade. Só o homem está capacitado para fazer escolhas livres. A expectativa
é que elas ocorram sem que prevaleça a imposição formal de rótulos. Se os
estereótipos “chefe”, “professor”, “senhor” etc. prevalecem, o limite de um
(área de mando ou doutrinação) tende a se sobrepor ao limite do outro, o que
caracteriza invasão cultural, subordinação ou até escravidão. Certo que a
estratégia reinante na maioria das sociedades é a hierárquica. Na pirâmide do
poder, do vértice para a base a ordem é a da bicada. Quanto mais próximos da
base a pressão recebida tende a ser maior. Tal poleiro existe para os
indivíduos e as instituições, da família aos agrupamentos corporativos. Uns e
outros mandam, impondo regras e comportamentos. O ideal é que processos de
relacionamento levem à logicização (normas), à amorização (valores) e à
comunicação (significados entendidos por retroalimentação). Com feedback podemos ter limites compartilhados
que nos humanizem. O desejo sem limites, poder concentrado e autoritário ou anarquismo
exacerbado, chegam a implicar em violência, e até barbárie. O anarquismo, como protesto, quando irracional,
tende a cair em regulações arcaicas. Regredimos a eras anteriores ao que se
entende por civilização. Violência e grosseria vegetam num círculo vicioso de
tiros contra o próprio pé.
No caso da política atual, choca o
sujeitar-se a progressivos retrocessos. Não temos uma política de Estado mas de
partidos. Partidos tendem a comportar interesses que se repartem mais do que
atitudes de compartilhamento no coletivo social. O Estado não deve se manter afastado das reais
necessidades dos cidadãos. Partidos são forças cujo papel dialético deveria
iluminar a cena política. Tem havido predominância de um personalismo centralizador,
que não cede à tentação de se obter benesses só para si ou para a patota. São
vozes de um cenário de desigualdades e injustiça, tanto da esquerda como da direita,
sem sabermos para onde sopra o vento.
A escolha consciente dos governantes, pessoas
cujos bens individuais não sobrepujam o coletivo, já é imposição para universal
consenso.
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RESPEITO AO SAGRADO
Ascânio Betarello
Existem obras consideradas verdadeiras
balizas para um viver mais saudável. Não raro possuem o caráter de livros
sagrados. Vejo a Bíblia como um deles. Livros que oferecem condições para
elevarmos a própria alma. Ao se deter em histórico menos civilizado corremos o
risco de nos iludir com paradigmas datados para não serem reproduzidos. É tirar
da letra o espírito, procurando entender contextos que chegam a ser diametralmente
opostos. O que temos hoje no mundo são fases atrozes que se repetem. Certo que
antes da civilização era a barbárie, ainda presente em povos beligerantes. Necessário
uma “fé raciocinada”, a fim de não nos perdermos em períodos nefastos que
jamais deveriam voltar. Lembramos governos imperialistas e ditaduras genocidas,
ainda existentes ou de épocas próximas. O tido como aceito em um um
período histórico, em outro pode chegar a
se tornar inadequado, inoportuno ou até condenável. O Novo Testamento, com os
ensinamentos de Jesus, serve como parâmetro para a moralidade e a ética. O
Velho Testamento dá lugar ao Novo, sendo que a filtragem deve ocorrer pelos
postulados que sucedem à pena do talião focada no espírito de vingança (“olho
por olho, dente por dente”). A
importância de perdoar está na oração do Pai Nosso, pilar do cristianismo. Pode-se
até constatar a traição que Jesus sofre até em nossos dias. Não vender a
própria filha, não ser racista nem homofóbico, não apedrejar culpados, rupturas
diplomáticas com nações que violentam o humano são algumas sobras históricas de
tempos pagãos. Livros em que se tira da letra o espírito, com um melhor
entendimento de contextos, podem ajudar. Penas capitais, torturas e amputações aparecem
no noticiário dos jornais. Há violência e escravidão, além de ilícitos dos mais
sutis aos mais escancarados. Lições bíblicas do que se deve ou não praticar
estão claras para quem faz vistas com o pensamento assistido pelo amor e pela
caridade. Sejamos esperançosos, fortalecidos por atitudes e ações capazes de
manter o concerto humano na melhor afinação.
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MEDO E DECADÊNCIA
Saint Dennis
Medo da perda de poder, algo que afeta
todos nós. Poder no sentido de manutenção da própria capacidade de interferir
em pensamentos e ações. No caso das ciências, o sentimento é de atrasar os
ponteiros do relógio evolutivo. Admito o quanto de boas mudanças já ocorreram
em nossas vidas e no mundo. O universo é dinâmico. Desde a invenção da roda,
parece que temos pouco a alterar em rotinas consagradas. A ciência, quando na busca
do conhecimento, é esforço renovado para novas aquisições. O mesmo deve ocorrer
com as religiões. Quando o Papa recomenda ser revolucionário a expressão visa
um humano mais digno e atuante na transformação do mundo para melhor. Há quem estabelece oposição inconciliável
entre ciência e religião. Problema das ortodoxias, doutrinação dogmática. Ambas,
ciência e religião, pertencendo a grupos fechados não se renovam. Ver outras
postulações, a desprezar por falta de comprovação empírica, é desmerecer a “dança do universo”. Grupos, onde quer que
estejam, fechados, se esgotam por falta de inspiração. Se muito abertos, a instituição
deles corre o risco de diluir-se. Ciência e religião, física e metafísica,
dando as mãos, podem conseguir o melhor nutriente para suas teorias e práticas.
Nós e o mundo sairíamos ganhando.
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