29/05/2014

O MISTÉRIO DO AMOR




Fala-se em amor. Pretender compreendê-lo racionalmente, a pior viagem. É o domínio do Eros. Na Antiguidade, era considerado deus, cuja divindade ultrapassava as fronteiras do humano. Portanto, não podia ser nem compreendido, nem descrito. Ele vai das alturas infinitas aos abismos tenebrosos. Imenso paradoxo. Vamos rodeá-lo com alguma reflexão.
Amor, essa “coisa” que redime. Mas ela pode estar tão carregada do que os outros devem fazer... A gente, terceira pessoa, sem se olhar e sem se perceber. Penso no “biscateiro de problemas” para quem sempre sobra algum problema, que lhe pertence. Fácil ver o outro como errado, em situação de flagrante intencionalidade ou de pura negligência. O que tem a ver com valores e atitudes. Tomar consciência dos próprios erros e desvios para não praticar o que seria o mais adequado passa, muitas vezes, longe de nós. No aqui e agora, quando falhamos? Ao se prender àquilo que merece censura, até com entes queridos, tal procedimento pode gerar um cotidiano atrós. A pessoa lembrando o que o outro não fez, que o racional foi jogado às traças, que não se cumpriu o prometido, que não adianta só falar... Nessa clivagem do certo e do errado, ir para a outra página... por mais nebulosa que seja. Esforço em ver cara e não só a coroa. “Necessário agir!” Um golpe de tolerância e, se der, boa dose de ternura.
Para quem proclama o “certo”, a algaravia pode fazer parte do “demônio”. O menino ou rapaz tido como irrequieto, irresponsável, distraído, amorfo – só visto assim, algo pouco articulado. Viés sem considerar a dualidade em que a vida flui. No fundo podemos estar sendo outra pessoa.
Um pensador e poeta poderia dizer: “Se você não sabe se gosta de verdade afaste-se, por algum tempo, de quem seria objeto de afeto maior”. Ao sentir falta da pessoa, em que se está ligado sentimentalmente, isso pode revelar a acolhida amorosa. Pessoa ou coisa, amados (penso também na materialidade). Porém, no cotidiano circunstancial de alegrias e tristezas, de comportamentos que se repetem, adentra o sentimento de acusação do não compromisso com deveres.
Pode ajudar o ato de reverter a atitude de “biscateiro de problemas”, com relação a certa intimidade entre pessoas, tornando-se o próprio alvo das admoestações. Aquela atitude do arqueiro zen: “Vou acertar a mim mesmo”. Acontece de o problema encontrado transmudar-se ao que habita em nossos corações. Mais digerível,  que seja denunciado fora do admoestador.
Não que a gente deixe, necessariamente, de amar, por exemplo, o companheiro ou a companheira. O amor, pelo volume de culpas atribuídas a pessoas queridas, empana uma relação que poderia despontar mais bela.       
Não confundir o que é compreensão, do sentimento de tolerância passiva. Homenagear convicta esperança de que o mundo vai melhorar. Ato de fé. Estado de redenção em horizonte de cores novas. Apontar o que está errado mereceria da parte do acusado desculpa, desculpa, desculpa... com leve ironia. Se as pessoas se amam? Parece que sim, mas vivem se cobrando... Ao pedir desculpas, com certa frequência, quem aguenta? Desafetos podem ser só em nível perceptivo, nada conjuntural, nem escrito na pedra... Quando gravado com martelo e ponteiro de ferro, tudo se complica.

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