Lendo
sobre um tipo de anjo bem humano, no espírito do ipansotera (palavra que criei)
– alegria e tristeza da vida. Esse anjo “personagem de si mesmo”, de carne e
osso, dentro das “contradições aparentes”, o maior dramaturgo do Brasil... Que
o mestre Antunes Filho admirava, encenando-lhe, com brilhantismo, várias peças.
Mas vamos lá. Estou chegando à metade de uma leitura de outro exemplo da boa cultura
existencial, epígono de Nelson Rodrigues, o escritor e jornalista Ruy Castro.
Seu livro, “O Anjo Pornográfico” é como um romance, sem se fechar no relato
frio dos “idiotas da objetividade”, segundo a análise de Sábato Magaldi (orelha
do livro). “Idiotas...”, expressão cunhada por Nelson. Tenho mergulhado nessa
forma de conhecimento nutrido pelo sentimento, lado mais profundo de nossa
existência. Numa sincronicidade, além de Ruy Castro e os “ensaios selvagens” de
Luiz Felipe Pondé (“A Filosofia da Adúltera”, inspirado em Nelson), me cai às mãos
o artigo “As Copas de Nelson Rodrigues”, do jornalista, escritor e ministro do Esporte
Aldo Rebelo (Folha de S. Paulo, 14/5). Muito se escreveu sobre o “anjo” e eu,
certa vez, em curso de pós “lato sensu” sobre arte, realizei montagem tridimensional
em que, olhando pelo buraco de uma fechadura se divisava nu feminino. Isso
sugere minha testosterona da época. Na epígrafe do “Anjo Pornográfico”, a frase
de Nelson: “Sou um menino que vê o amor pelo buraco da fechadura”. Acredito ter
lido isso depois. Ele acrescenta que o buraco da fechadura é, realmente, a sua ótica
de ficcionista. De forma meio atabalhoada jogo agora, auxiliado pelo Aldo Rebelo,
outras expressões desse gigante de nossa literatura. Expressões como “esquerda
festiva”, “padre de passeata”, “o marxista de galinheiro”, “cronista-patriota”
(se autodefinindo de modo a causar “um divertido horror”), “narcisos às avessas,
que cospem na própria imagem” (aos que torciam contra o Brasil, embora reconhecesse
que nem todos eram assim, senão a maioria), “gana destrutiva e bestial” (atribuição
a quem chamava de “entendidos da crônica").
Na
fase do golpe e implantação da ditadura militar, via Nelson como reacionário e,
depois, experimentei sua angústia com o próprio filho preso (e torturado?). Filmes
e peças foram mudando o meu olhar.
Talvez me reserve para alguma análise mais
aprofundada pela leitura de Ruy e Pondé, onde o temperamento de uma pessoa se
transforma em caráter. Sobre o teatro de Nelson, estou em outro momento, com
algumas cicatrizes, preferindo as atividades literária e de blogueiro. “Desejo é escravidão e temperamento é destino”
(Pondé).
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