O
progresso das técnicas e das ciências é algo indiscutível. Hoje, também, já nos
informam sobre as terras e carnes da espiritualidade. Um pouco de desassombro,
e talvez alguma dose de curiosidade ecumênica, nos leve à leitura de Kardec,
André Luiz, Inácio Ferreira, só para citar quem pode nos instigar. Há
pensadores mais cuidadosos com o considerado correto pelo senso comum e
acadêmico, fora de maiores transcendências. Só que a morte é uma realidade sem
preço, nem aviso. Caberia pensar e estudar sobre o que pode ser final de rota
ou passagem para outro plano? Dessas hipóteses existe um arco que vai do
pessimismo tacanho para um espaço otimista de melhores possibilidades. Nele, o
que muda é a frequência ondulatória de novos sentimentos e saberes. No arco há
nuances de compreensão maior ou menor e também fechamento para teores, como o
alcoólico para uma bebida.
Pego
um exemplo que me chegou pelo amigo João-Francisco Duarte Jr. autor do livro “O
sentido dos sentidos”. Ele cita uma
compilação feita por René Dubos do trecho de uma revista científica de época.
No Scientific
American, de julho de 1899, há uma discussão dos prováveis efeitos que o carro a motor teria sobre a vida urbana, quando a produção em massa lhe tivesse baixado o preço:
American, de julho de 1899, há uma discussão dos prováveis efeitos que o carro a motor teria sobre a vida urbana, quando a produção em massa lhe tivesse baixado o preço:
“A melhoria das condições urbanas graças à
adoção geral do carro a motor dificilmente pode ser subestimada. Ruas limpas,
sem pó e sem mau cheiro, com veículos leves de rodas de borracha a moverem-se
em rapidez e sem barulho pela sua lisa expansão, eliminariam a maior parte do
nervosismo, da distração e da tensão da vida metropolitana moderna.” Recomendo ao leitor entrar em contato com João-Francisco na obra
citada, seu comentário sobre “esse futuro limpo e feliz”, insistindo no montante
de irracionalismo por esse encaminhamento da civilização moderna. As
advertências parecem ecoar no vazio, o mesmo tendendo a ocorrer com o artigo de
Ruy Castro, publicado na Folha, na Sexta-feira da Paixão. O título é “Nós em
2214”. Alguns trechos: “Quando a história falar de nossa época, páginas
importantes serão dedicadas ao automóvel. ‘Era um veículo impraticável,
dispendioso, poluidor e assassino’, elas dirão. ‘Apesar dessas evidentes
desvantagens, alguns países insistiam em fabricá-lo, em vez de investir em
meios de transporte mais razoáveis. Ou planejar as cidades de modo a que as
pessoas pudessem ir a pé, ou de calçada rolante, para seu trabalho ou lazer.’
Países pararam de fabricar, outros o privilegiaram com alíquotas camaradas. Num
lugar chamado Brasiguai, os mandantes continuaram a estuprar as cidades com
viadutos e túneis e a derrubar casas para abrir estacionamentos. Uma sucessão
de fatos levam a total paralisia. Cidades isoladas e sem abastecimento. Pessoas
enlouquecidas. Saques, instituições destruídas e gente se esganando entre si. O
governo ruiu. Quem se cansou de avisar nem se mexeu para ajudar. O Brasiguai
regrediu a 1500, à economia primária, de comer o que há em volta.
Lembro
estatística, nos anos 70, que colocava o automóvel como a maior causa mortis, ganhando da soma de todas
as guerras. Na ocasião trabalhava com workshops de sensibilização para
executivos de importantes organizações. Brinquei com a questão: “Quem seria
funcionário de uma empresa, cujo produto, mais matou pessoas?” Havia
unanimidade na resposta negativa. A empresa era uma fabricante multinacional de
automóveis.
Meus
agradecimentos ao João-Francisco e a Ruy Castro. Eu, como ombudsman de mim, ainda guio, enfrentando cada vez menos o bulício
enervante de uma metrópole como São Paulo.
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