21/04/2014

COMO ESTAMOS E VAMOS FICAR



O progresso das técnicas e das ciências é algo indiscutível. Hoje, também, já nos informam sobre as terras e carnes da espiritualidade. Um pouco de desassombro, e talvez alguma dose de curiosidade ecumênica, nos leve à leitura de Kardec, André Luiz, Inácio Ferreira, só para citar quem pode nos instigar. Há pensadores mais cuidadosos com o considerado correto pelo senso comum e acadêmico, fora de maiores transcendências. Só que a morte é uma realidade sem preço, nem aviso. Caberia pensar e estudar sobre o que pode ser final de rota ou passagem para outro plano? Dessas hipóteses existe um arco que vai do pessimismo tacanho para um espaço otimista de melhores possibilidades. Nele, o que muda é a frequência ondulatória de novos sentimentos e saberes. No arco há nuances de compreensão maior ou menor e também fechamento para teores, como o alcoólico para uma bebida.

Pego um exemplo que me chegou pelo amigo João-Francisco Duarte Jr. autor do livro “O sentido dos sentidos”.  Ele cita uma compilação feita por René Dubos do trecho de uma revista científica de época. No Scientific
American, de julho de 1899, há uma discussão dos prováveis efeitos que o carro a motor teria sobre a vida urbana, quando a produção em massa lhe tivesse baixado o preço:
“A melhoria das condições urbanas graças à adoção geral do carro a motor dificilmente pode ser subestimada. Ruas limpas, sem pó e sem mau cheiro, com veículos leves de rodas de borracha a moverem-se em rapidez e sem barulho pela sua lisa expansão, eliminariam a maior parte do nervosismo, da distração e da tensão da vida metropolitana moderna.” Recomendo ao leitor entrar em contato com João-Francisco na obra citada, seu comentário sobre “esse futuro limpo e feliz”, insistindo no montante de irracionalismo por esse encaminhamento da civilização moderna. As advertências parecem ecoar no vazio, o mesmo tendendo a ocorrer com o artigo de Ruy Castro, publicado na Folha, na Sexta-feira da Paixão. O título é “Nós em 2214”. Alguns trechos: “Quando a história falar de nossa época, páginas importantes serão dedicadas ao automóvel. ‘Era um veículo impraticável, dispendioso, poluidor e assassino’, elas dirão. ‘Apesar dessas evidentes desvantagens, alguns países insistiam em fabricá-lo, em vez de investir em meios de transporte mais razoáveis. Ou planejar as cidades de modo a que as pessoas pudessem ir a pé, ou de calçada rolante, para seu trabalho ou lazer.’ Países pararam de fabricar, outros o privilegiaram com alíquotas camaradas. Num lugar chamado Brasiguai, os mandantes continuaram a estuprar as cidades com viadutos e túneis e a derrubar casas para abrir estacionamentos. Uma sucessão de fatos levam a total paralisia. Cidades isoladas e sem abastecimento. Pessoas enlouquecidas. Saques, instituições destruídas e gente se esganando entre si. O governo ruiu. Quem se cansou de avisar nem se mexeu para ajudar. O Brasiguai regrediu a 1500, à economia primária, de comer o que há em volta.

Lembro estatística, nos anos 70, que colocava o automóvel como a maior causa mortis, ganhando da soma de todas as guerras. Na ocasião trabalhava com workshops de sensibilização para executivos de importantes organizações. Brinquei com a questão: “Quem seria funcionário de uma empresa, cujo produto, mais matou pessoas?” Havia unanimidade na resposta negativa. A empresa era uma fabricante multinacional de automóveis.
Meus agradecimentos ao João-Francisco e a Ruy Castro. Eu, como ombudsman de mim, ainda guio, enfrentando cada vez menos o bulício enervante de uma metrópole como São Paulo.   

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