Não sou cronista, motivo de felicidade.
Escrevo por compulsão, e não preciso de assunto. O que ocorreu no ano de 2013, desde os protestos
de junho, o julgamento do mensalão e outros tantos fatos e/ou versões
(Nietzsche) não dão partida no meu motor. Faíscas pouco eficientes para
acioná-lo. Meu mundo mental é mais movimentado. Mais do que a ficção (já me
acusaram de ficcionista nato), o que me interessa é o que está por trás de
ações e conceitos. Erraram ao decretar a morte da História. E das ideologias.
Existe uma antiideologia que serve tanto para a esquerda como para a direita. Interessa
o relato sobre nós mesmos, minudências que fazem parte da hipocrisia que
homenageia a virtude (La Rochefoucauld). Na minha pretensa garimpagem é o que
me ocupa as horas.
Aprender a desconfiar da palavra, algo
sedutor. As palavras e as coisas... Faço superficiais considerações sobre o que
está mais ou menos sacralizado no cotidiano.
A própria noção de humanidade entra no jogo. Se a palavra é importante ou não, até para
dizer isso dependemos dela. Restrições a atitudes e comportamentos, violência e
guerras aparecem do que se diz ou escreve. O sistema se assenta armado, e
quando não atua de forma explícita vegeta em sono nababesco. Acorre-se a ele (o
sistema) num piscar de olhos.
Reconheço haver idealização no que expresso,
pois acredito que o
homem deve dar passos numa reincarnação
para se encontrar. (Reencarnação é outra coisa.) Há palavras perigosas como
ética e moral, por exemplo. Espiritismo, outra palavra que sugere crença, ameaça
ruir edifícios. Talvez pelo receio de se ter de encarar fatos com perseverança.
Comparar doutrinas sobre a passagem da
vida corporal à vida espiritual, penas e recompensas futuras, a situação real
da alma durante e após a morte... Quando
alguém diz “falta ética”, qual o ponto de vista? Associa-se a expressão à própria
consciência? O comum, ao se falar em ética, é não considerar o que nos foi injetado
desde a infância. Sistema de valores por trás. Existe a ética que compara pessoas
com ratos e piolhos, pensando em pureza e ordem (nazismo). Justificaria assassinatos,
como medida higiênica. Tributo sagrado ao sangue puro.
Você poderia estar pensando em embelezar
o mundo. Não é isso que se pretende com a maquiagem? Esta como força motora,
tornando as pessoas e os objetos mais consumíveis, independentemente do conteúdo.
A arte e o design podem entrar aqui
como uma espécie de “pedra de toque”. O pensamento e as escolhas, orientados
pela pureza dos princípios. Aqui, muito de respostas esperadas. A propaganda
para vender e a
publicidade para convencer, salvando o mundo e as pessoas.. E, claro,
os negócios. A educação dos sentidos para fortalecer um poder, seja político,
corporativo, mercantilista, religioso... A ilusão, a realidade forjada para se alçar
voo. O mito do corpo, instrumento para encenações, com ou sem caráter. A
distinção entre arte pura e arte degenerada, coisa também de esse-esse (SS) .
Depravação espiritual e intelectual. Os costumes legitimados apontariam para o
que é falta de educação e doença mental. Nosocômios para gente “anormal” até hoje
funcionam assim. Problemas estéticos passam a ser problemas médicos. Estes, no
mundo, chegam a liderar a política das passarelas e a racial. Bases:
hereditariedade, eugenia para a geração de belo indivíduo, obediente,
conformista, adequado ao mundo em que prevalece uma visão única. Se a beleza é
oca, não importa.
A pergunta é: como ser menos idiota?
Estatísticas, porcentagens, quantificação, lobbies
– armas perigosas. Um povo bonito e saudável pode ser o menos ético, fútil ou
corrupto. A apropriação da natureza... Como se usam vidros e janelões para se
descortinar paisagens! Eis uma correlação de corpo – o humano e o natural – e
arte. Regras, normas, leis numa preocupação histérica com o que pode e o que
não pode, legitimidade, arenas grandiosas e de alto custo para espetáculos, grandiloquência
no uso da palavra, sensibilização massificante, a mão sobre o peito ou juntas
homenageando o pensamento único. A voz e as palavras altissonantes. Bárbaros
são os outros. Tal a importância da “razão instrumental” voltada para funções, quando não se admitem falhas. Quem tem poder
doméstico e social cuida do “corpo” das pessoas.
Ao se pôr o pensar como prioritário, a decisão
é sempre emocional. O cérebro antecipa situações, fisicamente. Mãos suadas,
antes de entendermos o que está ocorrendo. Saber é sapere (sentir o gosto). Aprender é apreender. O corpo como medida
do mundo. Nessa visão material da mente, o soma (corpo) viabiliza a palavra. A imprensa
escrita e falada, a propaganda e a publicidade (aqui entram os marqueteiros), a
educação familiar e a das escolas, condicionam mentes e corações, gerando robôs. O fruidor não deveria sair produzido dessas
oficinas formais e informais, mas disposto a refletir, vivenciar e experimentar
por si mesmo. Aprender a indagar sobre contextos é melhor do que porquês que
levam à causa, da causa, da causa. Não saber perguntar é o mesmo que não saber
o que se quer e do que se necessita. Até para falar na superioridade das
imagens precisamos da palavra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário