Meu interesse pela política recebe
um novo lume. Li, de Sérgio Abranches,“A democracia sitiada”no suplemento “Ilustríssima”,
da Folha, 23 último de abril/2017. Foco da matéria: “as revelações sobre
corrupção ampliam o fosso entre partidos e cidadãos”. Algo que não mudará com a
simples alteração das leis eleitorais. Comum o debate sobre efeitos, omitindo-se
a grave situação institucional. Cada vez aumenta mais a desconfiança na
política, nos políticos e nos partidos. Teria passado a era desse tipo de democracia? Tão competitivos e
desconectados da sociedade, os partidos não sustentam uma democracia plena. Os
caminhos para sua revitalização nunca estiveram tão claros. Exige-se o
encorajamento da participação popular, não o contrário. Com a oligarquização
dos partidos, dominados por grupos políticos que se perpetuam no poder, a
pretensão é o trampolim para cargos e posições e o negociar em transações
milionárias e ilegais. A consequência é os cidadãos virarem as costas para a
política. Hora de se buscarem salvadores populistas – o gestor, o não político.
Crise de representação para a social-democracia. No mundo inteiro temos um
ciclo político-econômico-social com o público dada vez mais distanciado da
política. Governos de esquerda e direita chegam a resvalar para o puro
populismo. O que costuma ser sucedido pelo complexo de austeridade, acarretando mais desemprego e
maiores perdas. A desigualdade na repartição de recursos sóciais, econômicos e
educacionais reforça as distorções. Votar em quem e para quê? Daí o futuro de
uma democracia despolitizada, sem povo? Algo dirigido com eficácia, mimetizando
a gestão privada, afim de garantir direitos constitucionais. Situação
transitória? Melhor: participação eleitoral justa e igualitária. A sociedade
dispõe de ferramentas para, no jogo, fazer suas escolhas. Ela tem reagido
contra o aumento de impostos travestidos de contribuição necessária. Nossa
carga tributária é brutal, desigual e complexa. Diz o articulista: “Temos um
Leviatã anêmico, grande, burocrático e ineficaz”. E acrescenta falando no
quadro educacional em frangalhos, que contribui para o aumento das
desigualdades sociais e políticas. O sistema de saúde está em colapso. A
população não é protegida sob risco de conviver com surtos epidêmicos, como os
de dengue, zika, chikungunya e, recentemente, febre amarela. O gasto público
premia setores ineficientes, obsoletos e de impacto nocivo em muitas áreas. Os
partidos convergiram para um padrão de comportamento clientelista. Em lugar de
coalizões de propostas forma coalizões de comparsas. Ambiente propício ao
financiamente ilegal e ao suborno para fins políticos e o enriquecimento
ilícito. Busca-se a perpetuação das oligarquias no poder. O que também influi é
o fundo partidário. Corrupção e troca-troca de favores são elementos a extirpar
da nossa cultura política. O famigerado sistema, desculpa para a entronização
do que se faz, e, principalmente o que afeta o cidadão. Muito se acoberta no
ataque aos cofres públicos. Ajustes no preço final, o que gera o sobrepreço a
financiar subornos, além de engordar o caixa das empresas. Exemplo: as tenebrosas
transações da Odebrecht, praticamente a “dona” do país. Nunca tivemos algo
semelhante. Vasta máquina de corrupção política, utilizando métodos de gestão
empresarial. Hoje e no futuro, precisamos de um misto de escolhas, face a
imprevistos inimagináveis. Movimentos incontroláveis nas camadas tectônicas da
transição. Nada de impotência diante desse quadro. Perigosa a opção pelo
silêncio político e a alienação eleitoral. Pior o protesto violento e sem foco.
Divisões polarizadas estéreis. O que fortaleceria a gestão de forças
retrógradas castradoras das liberdades à custa conquistadas desde os anos de
chumbo da ditadura. Sérgio Abranches aporta num alerta precioso: “Afastamos a
ditadura e construímos a Terceira República, a mais democrática de nossas
experiências republicanas, com todas as falhas que temos visto. Vencemos a
hiperinflação. Reduzimos a pobreza e a desigualdade”. Ele fala ainda nas duas
tarefas coletivas que temos pela frente: “Revigorar nossa democracia,
tornando-a menos vulnerável à corrupção e ao controle oligárquico, e definir os
modos pelos quais atravessaremos a grande transição do século 21”.
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