Aprendi que “no começo é a ação”. O reforço apareceu com a noção
do “corpo” como abrangente. Isso põe em questão a supervalorização da palavra,
das ideias e do pensamento. Falar, escrever... e não agir. Mais tarde, graças
ao “sagrado”, aparece o “verbo” como o início de tudo. Com o quê ficamos?
Observo
a criança dedilhando, pela primeira vez, em um teclado, desses eletrônicos. Não
sai nenhuma sequência melódica. Ela explora possibilidades apertando botões de
forma aleatória. De repente, ao descobrir o som percussivo com a célula que se
repete, ergue a cabeça para quem a observa, sorriso de satisfação. O corpo
acompanha o ritmo. A criança se empolga, demorando a deixar o aparelho.
Mais
um reforço: o corpo, o ritmo – coisas físicas, concretas, tangíveis. É o movimento.
Eu
costumava introduzir dança de salão, nos moldes das de anos passados (1940 e
50), pares juntinhos, até conversando. Foi assim que me declarei à minha atual
esposa. Dei aulas nos níveis médio e superior, com oportunidades para o
exercício do diálogo. O que fiz, também, nos grupos de teatro. Assim como uma bola
que se joga para as crianças, no exercício cooperativo – melhor do que
doutrinação – na grupoanálise com os alunos, depois do samba e do bolero
dançados, falávamos sobre diálogo e reciprocidade. Época das discotecas,
danceterias, hoje baladas – quando, em geral, ninguém é de ninguém.
No
ambiente escolar eu funcionava como um facilitador do processo de trocas de
parceiros, interessado em promover reciprocidade até com “os diferentes”. Em
certos momentos eu gritava “trocar!”, mantendo um clima vivencial de alegria. O
importante não era saber dançar, mas até arriscar passos a dois.
Na
dança de salão, cada modalidade musical enseja desde as simples, até evocuções mais sofisticadas. Eu
evitava estimular competição, sem corrigir erros Até os menos capazes chegavam
a seguir os andamentos. O tango, um dos ritmos mais difíceis, era trabalhado na
forma menos complexa, cujo exemplo era Al Pacino, em Perfume de Mulher. A
modalidade espetacular, dançada em Buenos Aires, não servia como o melhor
exemplo.
Havia
sensualidade? Sim. Mas no clima de maior respeito mútuo. O estímulo maior era o
da relação equilibrada de cada um, sem perder a própria individualidade, numa
amorização sob controle.
Ação
e ideia, palavra e ação... Na dança a dois, no estudo do diálogo e da
reciprocidade (sentimento do “nós”), o abrangente é a ação. Daí para a ideia,
ambas, palavra e ação, interagindo. O agente (problema) é quando a pessoa se
prende num gozo individual. Isso não vale para as interrelações humanas?
Agora,
a proposta que faço para se considerar o que prevalece: a ação ou o verbo, como
fator original no processo vital da existência humana.
Velho
esquema, aprendido com G.W.G. Moraes: Tudo se reduz a dois – a dualidade em que
a vida flui. Abrangente e agente, como receita impecável. Opostos sempre
interagem, um contendo o outro, embora um dos dois prevaleça no desenrolar dos
fatos. Aí, cabe considerar o espaço/tempo, outra dualidade. Se o espaço, em
dada ocasião, é o abrangente, não se planta pinheiros na proximidade do telhado
da casa. Você pode amar a natureza, mas o risco de ter árvores frondosas nas
calçadas é grande para a segurança das pessoas.
Então,
quando “no começo é a ação” ou “o verbo é o princípio”? Que tal pensar um pouco
além da circunstancialidade do cotidiano em que vivemos?
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