É nome de um filme o título acima e, basicamente, tem a ver
comigo. Época de certa perturbação intelectual entre desejos e obrigações. O
cinema, desde cedo, moldou minha vida. O cognitivo e sentimentos, a opção
sexual, o machismo e seu tom autoritário, preconceitos a não enumerar aqui...
São tantos. Bagagem a ser trabalhada pelo escritor que assumi. Pede uma reflexão sobre valores e conceitos, atitudes e
comportamentos. Afinal, a vida é feita de entraves e deslanches. Hoje penso que
não dou para mais nada, daí escrever, fotografando e me banhando na plasticidade
rítmica dos compassos do dia a dia. Em música, violão doméstico e percussão dão
para esticar o potencial expressivo. Tudo se enquadra na utopia. Já me disseram
que o meu viver é ficcional. O filósofo pré-socrático Heráclito, com sua visão
estética do mundo, me consola. Cinema e dramaturgia compensam o escapismo. No
filme “Homem sem rumo” Kirk Douglas foge do arame farpado. Bela metáfora do
sistema que abotoa em nós um colete apertado. Gosto dessa imagem do colete, que
reproduzo sem pejo em muitas ocasiões. Aquela ideia de Nelson Rodrigues de que sem
as repetições dele não era nada. Repetições sedimentam. “Não aceito a ordem de
um botão”... pertence à letra de um
samba que compus e foi musicado pelo Raul Sucena. Claro que me sinto como
Contardo Calligaris, que se chamou de anarquista bem comportado. Senão, eu já
estaria expulso do sistema em que vivo. (Menos pedante sistema do que status quo
ou establishment.) Arame farpado, no
filme comentado por Inácio Araújo, faz pensar em “direito de propriedade”. Não
me vejo como um bom vivant, mas quem
experimenta prazer e autorrealização em modestos procedimentos. Fujo, tenho me posto
fora de cenas... A sela num trem e ir embora, tão logo soe a campainha de padrões
que nos prendem no “dever ser”. A sensação de liberdade é também me ver como pessoa
responsável. Responsabilidade implica em não ficar ao deus-dará a propósito de
tudo, tirando os pés do solo, ainda que de lama. Quais compromissos assumir? Paradoxo? Sei que
a vida é feita de polos em atrito... mas que fazem o motor pegar. Outra
expressão repetida: “fluir na dualidade”. O próprio termo ipansotera, criado por mim, quer dizer “alegria e tristeza da
vida”. Não acreditar só em uma ou na outra. Adianta tergiversar? Cada um vive
num território pré-marcado. Quer queira ou não fomos criados para ajoelhar ao
constituído, seja família ou algum grupo a nos absorver... Ainda bem, para que
a gente não se sucumba ao próprio mundo interior. Estamos atados a bens de toda sorte, materiais, intelectuais
e espirituais. É um cuidar ou submeter-se a eles. Damos pouca importância a uma
dialética constituinte para rever significados. O ideal seria cultivar poder de
difusão capaz de produzir um bem-estar que se expande. O pior problema é se
sentir senhor absoluto, dono do efêmero. Nem o Rei sol mandava em tudo. Humanismo
babaca? Mas é o que faz a vida valer a pena. Melhor do que o papel da farpa no
dedo da própria alma.
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