Ao
lado da casa em que morávamos em São Paulo, em grande tamanho, em toda a porta
da garagem, reprodução da “Mona Lisa”, de Da Vinci. Questionados, os donos da residência,
que tiveram a ideia de decorar a própria casa com o grande artista da
Renascença, acabaram apagando a pintura. Ela durou meses. Estávamos nos anos
60/70, e a iniciativa de assim ilustrar a moradia, publicamente, era coisa rara.
Lembro anos depois de termos mudado de cidade, voltar a São Paulo, e encontrar
residências, em bairros classe média, transformadas em fortificações, com grades,
cadeados e cães bravios. Época do início das pichações e algaravias, comuns nos
anos 2 mil. Isso está acontecendo em todas as cidades, pequenas e grandes. É o
contraste entre o simbólico gravado, numa escrita mais de linhas retas e
angulosas, hermética para os “normais”, e imensas composições de imagens
representativas e/ou abstratas, até as de forte realismo fotográfico, em
grandes muros, paredes e fachadas de prédios e residências. Linguagem
incompreensível para muitos na escrita, mas bem cuidada nos grafites e
plotagens.... Forte contraste. O som cada vez mais alto dos carros, em ruas e
praias, que chegam a provocar irritação... No verso a “Pour Elise”, de
Beethoven, nos caminhões que vendem gás. Aumenta o número dos que sujam e
destroem calçadas, os que largam e jogam lixo em ruas, praças e estradas. Tensões
no trânsito, multiplicadas, por intransigências dos poderes e dos cidadãos. O
direito de ir e vir – com atrasos e obstáculos, previstos ou não –, bastante comprometido.
O lado triste dos edifícios, encardidos ou apodrecidos, logo ocupados pelos vadios
ou sem teto. Janelas quebradas e monumentos deteriorados, esculturas destruídas
ou com partes surrupiadas. Vandalismos nos espaços públicos (lixeiras arrancadas,
bancos quebrados, luminárias apagadas, banheiros infectos). E quem nos esbarra...
É ameaça? No fim chegaríamos ao clima, já citado, da peça de Jules Feiffer, “Pequenos
assassinatos”. Diz Contardo Calligaris, psicanalista e escritor, na matéria “O
Brasil existe?”, Folha de 22/5/14: “Um país em que a validade das regras de
convivência fosse apenas efeito de policiamento ostensivo só existiria como expressão
geográfica, porque ele não seria um país no espírito de seus supostos cidadãos”.
Recomendo esse artigo. Enquanto isso, pensar em “12 anos de escravidão” é muito
pouco.
Venho
relendo a crônica de Calligaris. Esta agora é a terceira postagem para o meu ipansotera.blogspot.com.
Como disse num texto, sem encontrar saídas, volto às origens. L.O.Lima, mestre
e amigo que foi, me ajuda a refletir sobre o grave problema que estamos
vivendo. Porta fechada... A janela que se abre tem a ver com a família, a empresa
e a escola.
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