Vamos aprendendo a escolher os
melhores alimentos. É assim, ou deveria ser assim. Para o físico e para a alma.
Aprender a viver pode ser isso. Ao lado do ter e do ser, existe o evitar.
Cria-se, também, zonas de escape e de silêncio para o que nos perturba ou nos
desagrada.
Militei com jovens em hospital
psiquiátrico. Comum entre os internos, as ferramentas do escape e do silêncio,
o que parece natural para todos nós. Havia momentos de surto, em clima de
concordâncias e discordâncias. Nos períodos de trégua, ocorria o apoio do calor
humano em reuniões de psicoterapia e grupoanálise.
Meu aprendizado em dinâmica de
grupo foi com Lauro de Oliveira Lima, mestre e amigo saudoso. Contato com a
prática artística e o teatro me ajudava na criação de oportunidades de expressão
do normal e do anormal.
Lembro o que li da psiquiatra Nise
da Silveira (e sobre ela). Sob sua responsabilidade
era o atelier de pintura num dos setores da terapêutica ocupacional – Centro
Psiquiátrico Pedro II, Rio de Janeiro (1946-1974). Época, inclusive, do
eletrochoque e dos fortes remédios bloqueadores quando a consciência disparava
ladeira abaixo.
Além da oficina de laborterapia, na
comunidade terapêutica em que trabalhei (Atibaia, anos 80), a gente utilizava técnicas
dramáticas. No teatro pintava-se e bordava. Soltava-se miasmas da alma. Imagens
que, uma vez destaca-das, serviriam de defesa contra o inconsciente invasor. Muito
do que poderia levar a situações de delírio aparecia no remanso do lago.
Imagino que se ia aprendendo a enfrentar regressão a zonas cavernosas da psique.
O jogo de ficção e realidade procurava ajudar no processo terapêutico. Numa
outra etapa, ou aí imiscuído, o trabalho de ressocialização.
A reflexão de que a arte nos ajuda
a viver melhor obtinha papel preponderante.
Desde criança e jovem, pensando em
valores, atitudes, comportamentos, muito devo às matinês de domingo. Sem TV e
Internet, o cinema falado americano, no seu maniqueísmo mocinho-bandido, é responsável
por autoafirmações machistas e preconceituosas mudanças sociais. Sentir, por exemplo,
que “barracão prende mais que xadrez” (de um samba de Noel). O reforço de tendências
e potencialidades deve muito à ficção. O cinema atual, pleno de efeitos sonoros
e imagens que se quebram vertiginosamente, chega a ajudar pouco no apuro da
sensibilidade e da reflexão.
Hoje, em casa, acontece diálogo
através de um conjunto musical doméstico. Embora grupinhos, até de crianças
pequenas, prefiram tablets. Elas se juntam e se isolam.
Voltando à música analógica, surgem
áreas através de voz, notas e compassos, mãos, dedos e cordas, percussão em
madeira, couro e metais, ou objetos, os menos declarados para esse fim, promovendo
a interação dos diferentes. Crianças com
celulares na vertente dos novos tempos de comunicação virtual. Adultos tocando
e cantando; outros, no jogo de Tranca. Uma coisa é se alimentar do que é mais
natural ou mais artificial, dependendo das escolhas, sendo que uma não exclui a
outra.
Sei que o processo de selecionar o
que nos faz bem (e quando nos faz bem), não parte de amplo consenso. Objetivos
existenciais e das escolas deveriam ser o da autonomia individual e da
interação social (Piaget). O de valorizar mais o natural do que produtos de
consumo desenfreado. Isso é homenagear a pessoa face ao indivíduo-padrão do
sistema toma lá–dá cá. Se a interação possui papel paradigmático, caminha-se
para a iniciativa, autoconfiança, e coragem de ser si mesmo. Tudo sob a égide
da saúde e da doença, do corpo e da alma.
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